Candidato cego que estudou em instituição especializada privada pode concorrer como cotista social
A
Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a um cego que
cursou parte do ensino fundamental em escola privada filantrópica, voltada para
pessoas com deficiência visual, o direito de concorrer como candidato cotista
nas vagas destinadas a egressos do ensino público, em uma instituição de ensino
técnico do Rio Grande do Norte. As vagas especiais são destinadas, em
princípio, apenas a alunos que tenham cursado o ensino fundamental
integralmente em escolas públicas.
Ao
reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) que havia
negado o direito à inscrição especial, a Primeira Turma considerou que o ingresso
do candidato na instituição filantrópica privada decorreu da escassez de
oferta, pela rede pública de ensino, de atendimento especializado para alunos
com deficiência. Dessa forma, com base no princípio da razoabilidade, a turma
entendeu ser legítimo o direito à participação do estudante no sistema de cotas
sociais.
“Frente
a esse contexto, é certo que a atuação do administrador (autoridade coatora)
deveria ter se orientado em harmonia com o vetor da razoabilidade, como
indicado no artigo 2º, caput,
da Lei 9.784/99, em ordem a assegurar ao impetrante a reivindicada inscrição no
teste seletivo junto ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Rio Grande do Norte”, apontou o relator do recurso do candidato, ministro
Sérgio Kukina.
Em
mandado de segurança, o candidato alegou que cursou parte do ensino fundamental
no Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do Rio Grande do Norte,
instituição privada de caráter filantrópico. Segundo o estudante, apesar de ter
cursado a escola beneficente por meio de bolsa integral, ele teve negado o
pedido de inscrição como cotista social na disputa por uma vaga em curso
técnico de nível médio do instituto federal.
O
pedido de inscrição como cotista foi negado em primeira e segunda instância.
Para o TRF5, ao cursar o ensino fundamental em entidade privada, ainda que de
caráter filantrópico, o candidato deixou de cumprir um requisito essencial da
cota social, que é cursar todo o ensino fundamental em estabelecimento público.
Razoabilidade
O
ministro Sérgio Kukina destacou que o artigo 53 da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação confere autonomia às universidades para
implementar ações afirmativas, a exemplo do sistema de cotas. Todavia, o
ministro também lembrou que, de acordo com a Lei 9.784/99, a administração pública deve
obedecer a princípios como o da razoabilidade, do qual se retira a
possibilidade de punição ao administrador que editar ato irracional ou que não
atenda à finalidade pública.
Segundo
Kukina, conforme alegado pelo candidato, retirar do aluno cego o direito de ser
considerado cotista seria puni-lo indevidamente por uma falha estatal – qual
seja, a ausência de escola apta a alfabetizá-lo em braile.
“Por isso que faz jus a se inscrever, como cotista por
‘equiparação’ a estudante egresso de escola pública”, apontou o ministro ao
conceder a segurança e garantir o direito pretendido pelo candidato.
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