Desvio de função pode gerar indenização para o servidor

Se você fosse um técnico de futebol, dificilmente escalaria um atacante para jogar de goleiro. Mas é mais ou menos isso o que costuma acontecer no setor público. Por causa da falta de pessoal, funcionários acabam desempenhando atividades para as quais não foram contratados, sem receber uma compensação por isso. É o desvio de função, termo conhecido entre os servidores. Mas o funcionário que enfrenta esse problema no trabalho pode receber uma indenização, se recorrer à Justiça.
Isso acontece nos casos em que o servidor estiver desempenhando uma função típica de um cargo com o salário maior do que o dele.
— O valor da indenização corresponde à diferença entre os salários dos dois cargos durante o período em que se caracterizar o desvio — diz o advogado Jean Paulo Ruzzarin, do escritório Cassel e Ruzzarin Advogados.
Ainda de acordo com ele, se essa compensação financeira for concedida, ela será corrigida monetariamente e com direito aos atrasados dos últimos cinco anos, desde que o servidor tenha ficado todo esse tempo em desvio de função.
— É um dos problemas mais recorrentes no serviço público — afirma o advogado, cujo escritório atende mais de 150 pessoas com ações sobre o tema.
Para o advogado Carlos Henrique Jund, do escritório Jund Advogados Associados, o desvio de função agride o princípio da legalidade administrativa:
— É obrigar o servidor, sem amparo legal, a ter atribuições diferentes das previstas para o cargo no qual ele ingressou por meio de concurso público.
O técnico judiciário do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) Gustavo Cezar Franco, de 34 anos, entrou, com outros colegas de trabalho, com uma ação para receber uma indenização.
— Passei a cumprir mandados, entregar notificações e intimações, funções de um oficial de justiça. Eu me sinto lesado. É como se fosse um enriquecimento ilícito por parte do governo, que paga mais barato pelo serviço — reclamou.
NO ÓRGÃO
A primeira providência a ser tomada quando o servidor identificar o desvio de função é pedir, pela via administrativa, no próprio local de trabalho, a correção do problema.
NA JUSTIÇA
Caso o recurso administrativo não resolva, o funcionário pode recorrer aos tribunais. Para provar que está desempenhando uma função que não é a dele, deverá juntar documentos.
DOCUMENTOS
A documentação que comprova o desvio varia de acordo com o cargo. Podem ser mandados judiciais que um técnico judiciário teve de entregar, no lugar de um oficial de justiça, ou prontuários médicos assinados por uma auxiliar de enfermagem, em vez de uma enfermeira. “Tudo no serviço público é registrado. Até a própria avaliação de desempenho pode ajudar”, explica o advogado Jean Paulo Ruzzarin.
TESTEMUNHAS
Os colegas de trabalho também podem ajudar, com depoimentos relatando o desvio de função.
PRAZOS
Na Justiça Federal, um processo pedindo uma indenização pode levar de cinco a sete anos até uma decisão final. Nos estados, esse tempo cai, em média, pela metade. Mas os tribunais podem conceder liminares determinando o fim imediato do desvio de função.
INTRANSFERÍVEL
Não é possível pedir a transferência para o cargo cuja função o servidor está efetivamente desempenhando, mesmo que ele tenha a qualificação exigida. A mudança de cargo é possível apenas por meio de concurso público.
CESSÕES
O advogado Marcelo Queiroz, do escritório Queiroz e Andrade Sociedade de Advogados, dá um exemplo sobre mudança de função para servidores cedidos a outros órgãos: “Um guarda municipal não pode ser escrivão da Polícia Civil, pois é um cargo que pode ser ocupado apenas por quem é da área policial. Mas ele pode ser um técnico administrativo na Polícia Federal. E se estiver recebendo o salário de guarda e este for menor do que o do técnico, pode pedir a indenização na Justiça”.
CARGO DE CONFIANÇA
Ainda de acordo com Queiroz, não há desvio se o servidor ocupar uma função diferente da sua, mas receber uma gratificação de cargo de confiança por isso.
POLÍCIA CIVIL
O presidente do Sindicato dos Policiais Civis, Fernando Bandeira, disse que um dos principais desvios na categoria é o de auxiliares de necropsia e papiloscopistas, que desempenham a função dos peritos. Além disso, investigadores e inspetores tomam depoimentos, tarefa que é dos delegados. Segundo a Polícia Civil, por uma questão de necessidade e pela falta de pessoal, esses dois casos realmente acontecem, mas os delegados e os peritos verificam os trabalhos e são responsáveis pelos mesmos.

Fonte: EXTRA

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